21 janeiro 2010

Quem comete o crime?

A cada quinze dias tem de se apresentar. Tem de provar que tem tido a conduta correcta e que se tem esforçado para mudar a sua situação. E tem de ter comprovativo de diferentes entidades desse esforço. Se os responsáveis assim o entenderem, podem propor-lhe que trabalhe em prol da comunidade. Não é aconselhável recusar. Quando terminar o seu tempo fará o que bem entender. Cessa a responsabilidade do Estado sobre si.

Este seria um regime duro para um qualquer criminoso sujeito a termo de identidade e residência. Mas não é. Este é o regime de um desempregado. Alguém que trabalhou, contribui para a Segurança Social e, seja por causa da Crise de por uma das muitas crises, perdeu o seu posto de trabalho e se inscreveu num Centro de Emprego.

O Estado, o nosso Estado, trata os desempregados como criminosos. Humilha os trabalhadores e as trabalhadoras no momento em que se encontram mais frágeis. Culpabiliza quem se encontra desempregado por se encontrar nessa situação.

E este é o tratamento reservado a quem tem direito a protecção no desemprego. A estes juntam-se os milhares de trabalhadores e trabalhadoras que não têm quaisquer direitos. Que por muito que trabalhem, e mesmo tendo descontado para a Segurança Social – como tantos e tantas de nós a trabalhar a falso recibo verde -, não chegam sequer a ter subsídio de desemprego.

A estes milhares de pessoas vai-se dizendo que os contratos de trabalho e protecção no desemprego são privilégios e não direitos. Privilégios que uns têm e outros não. Como se a injustiça da miséria de uns fosse a miséria de outros.

São mais de 600 mil os desempregados e desempregadas em Portugal. Mais de 600 mil pessoas humilhadas quotidianamente. Sem sombra de dúvida, uma enorme crueldade… e um barril de pólvora?
publicado no esquerda.net

07 janeiro 2010

Pensar, debater, construir política cultural

Nos últimos 10 anos Portugal assistiu a alterações profundas na dinâmica cultural do país, que não foram, no entanto, acompanhadas do necessário investimento financeiro, nem de corpo legislativo que assegurasse o serviço público que se exige nesta área.

O Bloco de Esquerda assumiu como eixos prioritários na política cultural o acesso das populações à fruição de bens culturais e a meios de produção artística e cultural, a salvaguarda do património cultural material e imaterial, e os direitos laborais dos profissionais do sector cultural.

Estes eixos exigem a tomada de posições, e a elaboração de iniciativas legislativas, relativas a modelos de financiamento da cultura, cartas de missão de equipamentos culturais e estatuto e certificação profissionais.

Para que este percurso ambicioso se faça com conhecimento do terreno e com os contributos dos agentes culturais locais e nacionais, vamos promover um conjunto de sessões públicas descentralizadas sobre política cultural, percorrendo os vários distritos do país, entre os meses de Janeiro a Março.

Nesta sessão, e nas que se seguem, debateremos questões relacionadas com a criação de cartas de missão para os equipamentos culturais, incluindo definição de objectivos de programação, serviços pedagógicos, requisitos técnicos e humanos, contratos-programa de financiamento e concursos para direcção, assim como questões relativas ao equilíbrio entre regulamentação nacional e autonomia local, regulamentação de redes e financiamentos directos e indirectos à criação e difusão artística.

A primeira sessão pública é já no domingo, dia 10 de Janeiro, no Porto, no Teatro Carlos Alberto, às 18h. É dedicada aos distritos do Porto e de Aveiro.

Apareçam!

03 janeiro 2010

...

8 de Janeiro será um dia muito difícil e estou cansada de ler textos deliberadamente confusos sobre o que está em causa. Sejamos claros:

Neste momento a legislação portuguesa relativa à adopção não discrimina com base na orientação sexual. Legislar, como o BE propõe, apenas para terminar com a discriminação no acesso ao casamento de casais compostos por duas pessoas do mesmo sexo não é possibilitar a adopção. (Nem sequer se aborda a parentalidade, questão mais vasta do que só a adopção). É simplesmente não impedir o que hoje já é possível; é não recuar no tempo; é não criar uma discriminação onde ela não existe. Associar o problema da adopção ao do casamento é dar armas aos preconceitos; na adopção não há discriminação. No casamento ainda há.

A proposta do governo PS, que ao mesmo tempo que acaba com a discriminação no acesso ao casamento cria uma nova discriminação no que à adopção diz respeito, não se limita a fasear acesso a direitos - o que quer que isso seja - mas dá também guarida a preconceitos homofóbicos preocupados em proteger as crianças das "famílias anormais".

Sei que há quem acredite sinceramente que este é um recuo táctico necessário; respeito quem assim pensa. Mas que a sua argumentação seja deliberadamente confusa entristece-me muito... e não ajuda nada aos difíceis equilíbrios que teremos todos de saber encontrar.