Não é possível debater o serviço público de rádio e televisão sem que se levantem questões sobre o poder. Tipicamente do uso que o poder político do momento faz dos órgãos de comunicação social públicos. E essa é uma questão inevitável, mas que não nos pode fazer esquecer uma outra: o serviço público de rádio e televisão é um instrumento de poder da população. E é como tal que deve ser defendido.
Este fim-de-semana, em Ponta Delgada, nas jornadas parlamentares do Bloco de Esquerda dos Açores, debateu-se o papel da RTP-Açores a partir da provocação: luxo ou necessidade? A resposta é clara: é um luxo que não nos podemos permitir não ter. Se uma análise meramente economicista nos diz que não podemos ter um jornalista dedicado a uma povoação que só tem 5.000 habitantes, a democracia exige o luxo de ter pelo menos um jornalista na ilha de Santa Maria. Que tem 5.000 habitantes.
Mas a defesa intransigente do serviço público de televisão só tem sentido se acompanhada de exigência. Uma RTP completamente centralizada e paternalista, que condena a RTP-Açores a um trabalho necessariamente menorizado por falta de meios e de autonomia, não presta serviço público. A RTP, serviço público, tem de ser capaz de produzir diversidade de conteúdos, de ser alternativa, de nos dar a conhecer. Esse é o serviço público que defendemos.
É bom lembrar que a RTP só tem um canal em condições de cumprir de facto serviço público: a RTP 1; o único canal que é visto em todo o território nacional em sinal aberto. A RTP-Açores só é vista nos Açores, a RTP-Madeira, só é vista na Madeira, o canal 2, fora do continente, só está disponível por cabo. E RTP-N, RTP-Memória, RTP-Internacional, RTP-África só são vistas por quem pode pagar.
A defesa do serviço público de rádio é televisão enquanto instrumento de poder ao serviço da população tem de se inscrever numa lógica de exigência de acesso ao conhecimento em duplo sentido: tendo acesso ao que todo o mundo produz e tendo acesso a difundir o que se produz em cada local. O acesso ao conhecimento só é arma de poder quando é também partilha.
Debater esta questão numa região ultraperiférica – e com uma nuvem que impede as ligações aéreas num reforço eloquente do significado de periferia – só reforça a sua centralidade. Afinal, quanto nos conhecemos?
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