16 novembro 2008

Eu, que não percebo nada disto, conto o que vi...

As aulas já tinham acabado. A professora estava na sala a corrigir trabalhos dos alunos. Parou, muito disponível, para falar com uma mãe (eu).
Ao lado da pilha dos livros de fichas que corrigia, estavam as fichas, já preparadas, para a próxima aula. Faltava recortar algum material para distribuir aos alunos. Aos 22 alunos. Na mesa em frente estavam os painéis quase prontos para as paredes da sala. Mais sílabas, que estarão sempre acessíveis aos olhos dos meninos.
A professora quer levar os alunos ao teatro este Natal. Já falou com a Câmara mas não conseguiu a carrinha - a que estava disponível não cumpre as normas de segurança. Tentou empresas privadas, mas percebeu que ficava muito caro para o bolso da maior parte dos pais. Falou com a Metro e só lhe cobram meio bilhete por aluno. Se o teatro não for acessível por metro, terá de falar com a empresa dos autocarros. Fiquei de ajudar na selecção do espectáculo. Como estou na associação de pais, acabamos também por conversar sobre as necessidades de acções de formação dos professores - vai começar a dos quadros electrónicos, mas era bom não esquecer a necessidade de uma actualização contínua em matemática e português.
Antes de me ir embora, avisa-me que vou encontrar mais um papel sobre o Magalhães na mochila da minha filha. Desabafa que tem perdido mais tempo do que julgava com isto; os campos de dados previstos não se adequam à diversidade da realidade. E, com um suspiro , vai dizendo que ainda nem olhou para as papeladas da avaliação; "não há tempo para tudo e os alunos estão primeiro".

E eu, que não percebi muito bem ainda o que se passa com a avaliação (os princípios da existência de avaliação e de avaliação pelos pares parecem-me razoáveis), fiquei com a certeza de que os professores estão - há muitos anos - a ser otários. Na tentativa de sobreviver a cada dia, preparando a cada dia o seu trabalho com os alunos, vão-se matando aos poucos. E, digo eu, no meio desespero apontam mal as baterias.

É normal que um professor prepare e dê aulas, corrija trabalhos, planeie actividades, faça formação, converse com encarregados de educação, e, até, avalie. É muito - pois é - é uma profissão muito exigente. E que exige muito respeito.
O que não é normal é que um professor perca tempo a tirar fotocópias, recortar e colar material, fazer telefonemas, pedir orçamentos, negociar contratos, inserir dados e tratar de vendas e papeladas. E também não é normal que um professor passe horas sentado a trabalhar em mobiliário desenhado para crianças. Ou que não tenha sequer um local para trabalhar. Ou para guardar o seu material de trabalho.

Suspender a avaliação é pouco, muito pouco. Os professores deviam suspender as suas actividades de auxiliares de acção educativa e funcionários de secretaria e ocupar os espaços da escola para conversar sobre educação e avaliarem-se e a todo o sistema, num exercício de democracia muito belo e que seria certamente catastrófico para os alunos, pais e país.

Situações dramáticas exigem acções dramáticas.

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